2006.12.09 – CEC – João Paulo Ferreira – Presidente da Direção do CEC

Apresenta-se neste módulo, entrevista que a LUISFER fez ao Presidente do CEC Clube de Entusiastas do Caminho de Ferro, Sr. João Paulo Ferreira, que era na altura, Presidente da Direção, que de forma simpática, aceitou o nosso convite e assim se disponibilizou em favor de todos os nossos leitores, muitos deles, igualmente colegas fans do comboio em Portugal e que a LUISFER, como é óbvio, igualmente agradece pela disponibilidade que fez o favor de nos dispensar. Este documento foi publicado no antigo blogue da LUISFER em 14 de dezembro de 2006.

0-JPF2 

Microfone01 LUISFER – Senhor Presidente, muito obrigado por nos conceder esta entrevista, igualmente em favor dos nossos leitores e que acontece, na data em que o vosso CEC, comemora 17 anos de existência. Por favor, fale-nos então um pouco sobre o percurso do CEC Clube de Entusiastas do Caminho de Ferro, nos últimos 17 anos?

Microfone01 João Paulo Ferreira – O C.E.C. nasceu da vontade de um grupo de pessoas interessadas na ferrovia que acharam por bem juntarem-se por forma a defenderem conjuntamente o caminho de ferro. Os primeiros doze anos de vida do C.E.C. foram algo difíceis pois não tínhamos um local onde nos reunirmos e juntarmos o nosso património. No entanto nunca esmorecemos e após alguma insistência conseguimos que a REFER nos arranjasse um espaço no qual instalámos a nossa sede e que se localiza na estação de Braço de Prata. Mesmo sem sede fomos conseguindo realizar alguma actividade, principalmente passeios  e exposições, mas é com a inauguração da mesma que o nosso clube vai conhecer um crescimento acentuado com o aumento considerável do número de associados. Importa referir também que ao longo da nossa existência sempre contámos com a colaboração das várias empresas ligadas ao sector ferroviário e também de outras entidades, nomeadamente autarquias, sem as quais muito do que foi feito não teria sido possível.

 

Microfone02 LUISFER – E no presente e futuro, quais são as grandes linhas que o CEC pretende alcançar e atingir?

Microfone02 João Paulo Ferreira – No momento presente pode-se dizer que atingimos o apogeu. Passado o boom inicial que a abertura da sede originou começou-se a notar um certo desinteresse que se traduziu numa diminuição da afluência à mesma e numa dificuldade cada vez maior em conseguirmos gente para fazer andar a “locomotiva”. Esta situação levou-me a ponderar a hipótese de me retirar, mas actualmente estou decidido a prosseguir, contando com o apoio daqueles que desde sempre me têm acompanhado e com a ajuda de algumas “caras novas”. Para o futuro estou a pensar em dinamizar fortemente a sede através da realização de sessões de projecção de diapositivos, filmes e funcionamento regular de uma maquete em HO que penso poder concluir e inaugurar até final do primeiro semestre de 2007. Paralelamente continuaremos a realizar passeios regulares de comboio e actividades culturais diversas, nomeadamente exposições. Com isto espero conseguir inverter a tendência actual e voltar a ter a sede aos Sábados cheia de gente, conforme sucedeu nos primeiros tempos do seu funcionamento.

 

Microfone03 LUISFER – Como sabe, os comboios no nosso país, comemoraram em dias já passados, 150 anos de história, de actividade e de exploração. Como viu esta data, seja na perspectiva da sua função como Presidente da CEC e pessoal também? Fale-nos igualmente das suas memórias?

Microfone03 João Paulo Ferreira – Uma data como esta merecia certamente muito mais, basta vermos o exemplo francês com a exposição de material circulante a sério realizada em plena Av. dos Campos Elísios em Paris nos 150 anos do seu Caminho de Ferro. Por cá não me parece que houvesse condições para fazer o mesmo na Av. da Liberdade, em Lisboa, mas certamente muito mais se poderia ter feito para além daquele amontoado de material circulante que tivemos ocasião de ver nas Docas de Alcântara. Sobre as minhas memórias é difícil falar, mas posso recordar um pouco uma férias passadas em Celorico da Beira em 1970, tinha então quatro anos, em que o meio de transporte utilizado foi o comboio. Nesta altura não havia comboios completos directos de Lisboa à Beira Alta, à excepção dos Internacionais, mas sim carruagens directas que seguiam atreladas ao célebre Rápido do Norte até Pampilhosa do qual eram aqui desligadas para serem depois incorporadas num Semi-Directo Coimbra – Vilar Formoso conhecido como Rápido da Beira. A demora na estação da Pampilhosa era grande, já que as carruagens directas à Beira Alta estavam sujeitas a várias manobras desde que eram desengatadas de um comboio até serem incorporadas noutro, mas isto para mim despertava grande interesse e tudo era  acompanhado com a máxima atenção da janela aberta da carruagem Sorefame de 1ª classe do tipo A9 na qual viajava. Seis horas depois de ter partido de Stª Apolónia chegava-se então a Celorico da Beira. Durante as férias eram muitas as vezes que o meu pai me levava à estação e dentre as várias situações que recordo lembro-me das cancelas tipo portão que protegiam a passagem de nível existente em Celorico da Beira fechadas manualmente por zelosas funcionárias sempre que se aproximava um comboio e do comboio correio que chegava todos os dias úteis pelas 18 horas e que, para além de inúmeros vagões fechados de madeira, trazia na sua composição, normalmente à cauda, uma carruagem correio vermelha à qual as pessoas se dirigiam para colocar na ranhura respectiva as cartas ou entregar encomendas para despacho aos funcionários que trabalhavam no seu interior.

 

Microfone04 LUISFER – Fala-se muito e todos sabem, que ainda mais liberalização será implementada nesta Europa ferroviária e por conseguinte no nosso país, especialmente no que toca às mercadorias. Como vê esse fenómeno?

Microfone04 João Paulo Ferreira – A liberalização do espaço ferroviário tem todas as condições para ser positiva na medida em que deverá conduzir ao aparecimento de diversas companhias que irão concorrer entre si o que deverá conduzir a uma melhoria dos serviços ferroviários e a tarifas mais atractivas partindo do pressuposto que a monopolização dos serviços traduzida na concentração daqueles numa só empresa leva a que aquela possa pôr e dispôr a seu belo prazer o que acaba por ser negativo para a imagem do Caminho de Ferro.

 

Microfone05 LUISFER – Nessa perspectiva de liberalização, que papel deve ter a CP e já agora também a REFER, doutro modo, em tempos presentes e futuros?

Microfone05 João Paulo Ferreira – A REFER deverá abrir as suas linhas em condições idênticas a todos os operadores que lho solicitem desde que reunam as necessárias condições de operacionalidade e, claro, paguem a taxa de uso da infraestrutura correspondente. Quanto à C.P. terá forçosamente que se tornar mais competitiva investindo fortemente em novo material circulante e apostando no lançamento de novos serviços adequados às necessidades dos seus potenciais clientes, sob pena de vir a perder para empresas concorrentes todo o seu potencial de mercado o que inevitavelmente conduzirá a médio prazo à sua autoaniquilação.

 

Microfone06 LUISFER – Além do CEC, existem ainda outras Associações e organizações de Amigos dos Comboios. Como as vê e que relacionamento acontece ou deseja que aconteça, entre a sua CEC e as outras entidades?

Microfone06 João Paulo Ferreira – Em Portugal, como em qualquer país civilizado, há espaço para todas as associações idóneas que queiram defender o Caminho de Ferro. Basta ver o exemplo espanhol em que quase todas as grandes cidades possuêm uma associação dedicada ao Caminho de Ferro. Quanto ao relacionamento entre elas, já que têm um objectivo comum há todo o interesse em que trabalhem unidas por forma a que os seus objectivos sejam mais fácilmente alcançados.

 

Microfone07 LUISFER – O que pensa sobre a CP Entusiastas?

Microfone07 João Paulo Ferreira – Não me posso pronunciar sobre aquilo que não conheço!

 

Microfone08 LUISFER – O que pensa sobre a política de Mário Lino, para o sector ferroviário e por outro lado, o que pensa (ou não), sobre a discussão do momento, ou seja, o TGV em Portugal?

Microfone08 João Paulo Ferreira – Pela primeira vez em vários anos temos um ministro empenhado em fazer algo pelo sector ferroviário, algo de muito positivo na minha opinião. Estamos no momento certo para avançar com as linhas de alta velocidade sob pena de perdermos o “comboio europeu do desenvolvimento”. A Alta Velocidade é necessária em Portugal, como o é em França, Espanha e outros países em que já existe e já perdemos demasiado tempo a discutir traçados. O projecto agora apresentado parece-me ser o mais adequado para as necessidades do nosso país e faço votos que Mário Lino tenha a mesma coragem que Fontes Pereira de Melo teve no século 19, em que contra todas as vozes discordantes avançou com a construção de linhas férreas no nosso país, e que também ele avance sem mais recuos para a construção das tão necessárias linhas de Alta Velocidade.

 

Microfone09 LUISFER – Senhor Presidente, nesta última pergunta, queira dirigir uma mensagem para os nossos leitores?

Microfone09 João Paulo Ferreira – Continuem a interessar-se pela causa ferroviária e façam tudo para divulgar o Caminho de Ferro, as suas vantagens e as suas qualidades junto de familiares, amigos, colegas e outros e não se deixem “enrolar” pelos “velhos do Restelo” que para aí andam a “pregar” contra a Alta Velocidade tal como há 150 anos o fizeram contra o Caminho de Ferro em geral. Tal como este, também a Alta Velocidade vencerá!

 

Microfone10 LUISFER – Senhor Presidente, muito obrigado pela sua disponibilidade.

Microfone10 João Paulo Ferreira – Obrigado eu pela atenção que me foi concedida, especialmente ao clube que dirijo. Tudo o que seja para promover e divulgar o Caminho de Ferro tem o meu apoio.

 

Nota: A entrevista foi feita à distância e por email. Agradecimento ao CEC pela foto disponibilizada.

About luis